Ronaldo Fraga expõe referências da crise migratória, no SPFW N41




Geralmente, não costumo comentar sobre as inúmeras semanas de moda que existem nas grandes metrópoles. Tampouco,  analiso os modismos frenéticos dos fashionistas que acompanham tudo e em tempo recorde, sem perder um mínimo detalhe. 

Mas na edição 41 do SPFW, no Brasil, o estilista mineiro Ronaldo Fraga, o qual tem toda a minha admiração e respeito como criador de moda, expôs com suavidade e astúcia um tema muito sério e delicado vivido por diversos povos ao longo dos anos, e que, atualmente, tem sérios problemas de preconceito e até expatriação, especialmente, na Europa: a crise migratória.

Quando estamos próximos a um problema, temos uma noção mais coerente a respeito dos fatos, apesar de toda informação fornecida pela mídia (quase) instantânea das plataformas on-line. Em Bruxelas, na Bélgica, presenciei a vinda em massa de Sírios que deixaram sua pátria, seu país, seus pertences e sua cultura em busca de "sobrevivência", pois, ao optar pela permanência em um país em guerra, destruído e massacrado por bombas e armas, eles estariam optando por "se entregar e morrer", provavelmente.

Posso dizer que, para os que vivem o problema, a situação é muito difícil. É de escolha e de abandono. Muitos imigrantes vieram a pé. São famílias inteiras, desmoronadas e sem esperança. Crianças, esposas, maridos, parentes em busca de um lugar para trabalhar e ter uma vida digna em um país desconhecido. E esse é apenas um dos inúmeros exemplos.

Na maioria das vezes, essas pessoas, já sofridas e cansadas, ainda passam por situações de preconceito e histeria por parte da população local. Os imigrantes não são bem-vindos, não têm espaço, e poucas são as sociedades que abrigam e dão suporte e condições mínimas de dignidade a eles.  

Mas, com beleza e requinte, Ronaldo Fraga trouxe o tema à tona, em uma bela e forte passarela, mostrando a coleção "Re-existência" (com muita sutileza), apesar de toda intolerância e preconceito que a sociedade, inclusive a nossa, tem com os povos imigrantes. 

Penso que, quando a indústria da moda age como agente comunicador, difundindo informações sérias e que fazem parte dos problemas sociais vividos por todos nós, ela se transforma, também, em agente transformador e dá-se o real valor a ela, através do seu poder em influenciar ações e hábitos, legitimadas, através de imitação, imagem e semelhança.     

Analisando, em termos, as inspirações do estilista e sua coleção, acredito que ao estampar essa história viva em um desfile de moda, o estilista Ronaldo Fraga - tão expressivo e reconhecido - conseguiu transformar, ao menos por alguns instantes, a intolerância que vibra fortemente em uma sociedade, até hoje, com relação aos imigrantes, principalmente, aos povos negros.  


As referências


Com inspiração africana, após uma viagem à África, Ronaldo traz tons e modelagens usadas em países como Burundi - em guerra - e por imigrantes moçambicanos que vivem em Portugal.

As referências que mais impressionaram foram as correntes (ou amarras), os tons e estampas em vermelho-sangue e os chinelos. Com delicadeza e cores vibrantes, as estampas de correntes em "ouro" transformaram as peças em modelos expressivos e "luxuosos". 




Modelagem masculina, por Rodrigo Fraga


Além das criações de Ronaldo, o desfile contou com criações do irmão e também estilista, Rodrigo Fraga. 





Ficha Técnica:


DIREÇÃO CRIATIVA: RoNALDO FRAGA./ BELEZA: Marcos Costa/ DIREÇÃO DE DESFILE: Roberta Marzolla./ INSPIRAÇÃO: viagem feita pelo estilista à África, especialmente Moçambique, refugiados de todo o mundo. /MATERIAIS: Algodão, linho, linho amassado, organza, tule, gaze, paetês, aplicações de flores, seda.


Bisou!



* Imagens: Zé Takahashi/ Ag. Fotosite para FFW 

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